Cuidados pediátricos: “Após o primeiro confinamento o descontrole foi geral”

A presidente da SPP, Inês Azevedo, deixa o alerta sobre a necessidade de manter os cuidados pediátricos, ainda que em contexto de pandemia.

22 Março, 2021

Alguns pais nos últimos meses, com intuito de proteger os seus filhos do vírus da covid-19, não têm assegurado os cuidados pediátricos das suas crianças. A presidente da Sociedade Portuguesa de Pediatria, Inês Azevedo, deixa o alerta sobre este acompanhamento não poder ser posto em causa, e ainda frisa a importância da manutenção da vacinação de bebés e adolescentes.

 

Tem verificado que os pais apresentam medo de levar as suas crianças a consultas regulares com o pediatra, ou até mesmo às urgências hospitalares?

Após o primeiro confinamento o descontrole foi geral. Por exemplo, as situações de asma estão a chegar aos especialistas já em fases muito avançadas, bem como crianças com diabetes inaugural estão a ser observadas passados três dias do seu surgimento. Até mesmo alguns casos meningites chegaram aqui muito tardiamente.

Apesar de tudo, hoje em dia penso que já não há um receio tão grande de recorrer às urgências, e ainda bem que assim é. De qualquer das formas, temos também de ser criteriosos e saber quando é que se trata de uma situação de emergência, de forma a não sobrecarregar os serviços sem necessidade.

Mas neste momento importa realçar a importância de os pais levarem as suas crianças às urgências sem medo. De momento já temos circuitos seguros e é importante que as pessoas o saibam. É um aspeto que me preocupa, e aos colegas em geral, é que estamos também a observar uma diminuição das consultas de saúde infantil.

Podem existir casos de pessoas que queiram ir às consultas, e não haver respostas dos serviços de saúde, mas é importante que as pessoas não deixem de visitar elas próprias o seu médico, bem como de levar os seus filhos ao médico. A pandemia de SARS-CoV-2 não é uma doença exclusiva do momento, continuando a existir várias doenças e é preciso que sejam detetadas atempadamente.

 

Existindo dois tipos conhecidos de meningite, a vírica e a bacteriana, qual a diferença entre ambas?

Existem dois grandes grupos de meningites, sendo elas a meningite vírica e a bacteriana. As infeções víricas também podem causar alterações do sistema nervoso central, tal como as bacterianas, mas a meningite vírica habitualmente é uma doença autolimitada e de muito baixa gravidade, apresentando sintomas regulares e relativamente simples, que todos já experienciámos.

A meningite bacteriana é causada por bactérias invasivas e essas sim, são muito graves. Na fase aguda, apresentam uma mortalidade que podem ter a curto prazo e, se não forem tratadas, podem mesmo ser fatais. As meningites tratadas precocemente e com todos os meios de que dispomos, ainda assim têm uma elevada mortalidade que, consoante os estudos, ronda os 10% e estão associadas também a sequelas que ficam para o resto da vida, como a necessidade de amputação de membros, a perda de audição e até perturbações no desenvolvimento cognitivo.

A meningite vírica é uma doença simples, no fundo. O termo assusta muito os pais e eu compreendo, tanto que até digo aos pais, em tom de brincadeira, que devíamos alterar o nome desta doença, pois estes dois tipos de meningite não são comparáveis de forma alguma.

Os sintomas mais frequentes das meningites são as dores de cabeça, os vómitos e as febres. E ainda que estes sejam sintomas comuns a várias outras doenças, ainda deixam os pais preocupados, pois existe quase uma memória histórica associada, sendo que antigamente a mortalidade por meningites era enorme, mas hoje em dia conseguimos tratar a maioria dos casos.

No tratamento da meningite o timing do início dos tratamentos é tudo e, portanto, se a criança apresentar sintomas compatíveis com uma meningite, não devemos atrasar o recurso a cuidados médicos. Para além das cefaleias e vómitos, existe ainda um mau estado geral da criança.  No caso de estarmos perante uma doença bacteriana grave, a criança está imensamente prostrada. Esses para mim é o sinal mais importante: mesmo quando a criança se mantém prostrada após a febre já ter baixado, este é um sinal de alerta muito importante.

 

Os movimentos anti vacinação são uma preocupação de momento no que concerne aos cuidados pediátricos, em Portugal?

Acima de tudo é de louvar a adesão das pessoas às vacinas, mas é de temer que existe alguma tendência crescente deste tipo de movimentos, devido à comunicação errada que muitas vezes é difundida por alguns grupos nas redes sociais e outros meios.

Os movimentos anti vacinais têm um historial residual no nosso país, mas ainda assim já alteraram um pouco a nossa História. Quando houve o surto de sarampo em Portugal, em 2017, tínhamos a doença praticamente extinta tendo apenas alguns casos importados e, o último já tinha sido registado em 2005, mas ainda assim esses movimentos tiveram alguma expressão, dando origem ao surto.

É um facto que existe sempre um fenómeno curioso nas vacinações: quando existe uma doença grave, toda a gente quer tomar a vacina, dando-se uma grande afluência da população para a sua toma. Consequentemente, os números de contágio começam a descer imenso nos anos seguintes, mas depois chega a um ponto em que a maioria das pessoas vai perdendo o medo da doença, por já não existe uma memória de grupo do que é que esta doença é capaz de fazer ao ser humano. E, à medida que os números da doença vão descendo, devido a uma boa cobertura vacinal, vão começando a surgir surtos.

Mas eu deixo um conselho: nós não nos podemos esquecer da nossa responsabilidade social, pois ao não tomarmos uma vacina esse comportamento não nos afeta só a nós, mas também àqueles que não a tiveram possibilidade de se protegerem. Por isso todos os profissionais de saúde têm um papel muito importante nessa explicação, mas também os media, os jornalistas, têm uma responsabilidade social muito grande de mostrar essa informação fidedigna, de forma a manter as pessoas informadas e devidamente esclarecidas.

De qualquer das formas, tenho de agradecer aos pais portugueses por serem fantásticos na adesão aos planos nacionais de vacinação. Temos a melhor taxa de vacinação da Europa e devemos de fazer com que isso se mantenha. Até mesmo as vacinas que não estão incluídas no plano nacional de vacinação – e que por isso são os pais que decidem adquiri-las, sendo algumas bastante caras, quando comparadas com o salário mínimo nacional – nós continuamos a ter uma cobertura vacinal muito substancial, à custa do esforço dos pais e isso é verdadeiramente de louvar. Até porque a única forma que temos de prevenir a meningite e muitas outras doenças é através da vacinação.

 

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