Carlos Rabaçal: “morrem 30 mil pessoas por ano por consequência de problemas cardiovasculares”
Em maio, mês do coração, o cardiologista Carlos Rabaçal reforça a necessidade da medicina preventiva: "prevenir é melhor do que remediar",
31 Maio, 2021
As doenças cardiovasculares ateroscleróticas continuam a ser a principal causa de morte do mundo, não sendo Portugal uma exceção. No nosso país temos notado, ao longo das últimas duas décadas, uma diminuição assinalável da mortalidade em consequência das doenças cardiovasculares, mas elas são também um setor importante no consumo de recursos na área da saúde, muito particularmente o acidente vascular cerebral (AVC) e ainda as doenças das artérias coronárias, como o enfarte do miocárdio e a angina de peito.
Em Portugal morrem por ano cerca de 100 mil pessoas. Dessas, cerca de 30 mil morrem por consequência de problemas cardiovasculares, sendo 7-8 mil devido a doenças coronárias, sendo o restante motivado por doenças cerebrovasculares. Também sabemos que a mortalidade prematura em Portugal (morte abaixo dos 70 anos) ainda se cifra nos 22-23%.
De qualquer forma é assinalável a redução da mortalidade, principalmente por AVC. Esta redução da mortalidade relaciona-se com vários fatores: sabemos de longa data que a melhoria das taxas de mortalidade destas doenças relaciona-se mais profundamente com a implementação de medidas preventivas, do que com o tratamento das doenças em si.
Em todo o mundo ocidental, a redução do impacto da mortalidade das doenças cardiovasculares assenta mais na prevenção primária do que no tratamento das doenças. E nesse sentido temos feito um trabalho notável com um melhor diagnóstico e tratamento de situações que, isoladamente ou em conjunto, condicionam as doenças cardiovasculares ateroscleróticas.
Mais de 60% da população portuguesa tem o colesterol elevado e uma das missões que nós temos, como profissionais de saúde, é identificar os indivíduos que têm colesterol elevado, avaliá-los do ponto de vista clínico e perceber qual é o risco que eles têm e depois atuarmos com fármacos ou aconselhamento dos hábitos de vida, no sentido de reduzir o impacto que o colesterol tem nestas doenças.
Portanto, para além de medidas terapêuticas de grande eficácia e muito seguras de que dispomos em todas estas áreas, há algo que nunca podemos deixar de fazer, que é tentar modificar o estilo de vida destas pessoas, para serem seres mais saudáveis. O tabaco é o fator mais simples, mas simultaneamente mais complexo de tratar, pois basta uma pessoa deixar de fumar que começa logo a ter um benefício, não precisando de nenhuma terapêutica para ter esse benefício, ao contrário do que acontece com a diabetes e com a hipertensão elevada.
Em Portugal, 20% da população com mais de 15 anos ainda fuma. E nós sabemos que qualquer que seja o fumo, incluídos os vaporizados, é prejudicial para a saúde. Temos por isso de enfatizar a redução, mas sobretudo abandono do hábito do tabaco, ou estaremos a pesar imenso na nossa saúde. No fundo isto previne as doenças e mais vale prevenir do que remediar.
A medicina preventiva é aquela que se considera a mais rentável a nível mundial, relativamente às doenças cardiovasculares. Nessa medida, temos usufruído na capacidade de intervenção e de diagnóstico destas situações, com a tecnologia adequada, e que nos permite limitar os danos que estas situações têm aparecimento destas doenças.
O outro grande benefício relaciona-se com aqueles que acabam por desencadear uma qualquer destas doenças. E nós efetivamente também dispomos de terapêuticas extremamente eficazes e seguras, para o tratamento não só do AVC, como também do enfarte agudo do miocárdio e da angina de peito.
Desde logo temos a capacidade de, com a evolução tecnológica que aconteceu no diagnóstico destas patologias, nomeadamente de imagem (TAC e ressonância magnética), poder observar quer a cabeça quer outros órgãos, e poder fazer diagnósticos de uma forma mais precoce e mais precisa. Esta inovação que acontece nos métodos de imagem que hoje são utilizados de uma forma “corriqueira” nos hospitais e laboratórios de imagem, permite-nos ter esta facilidade de decidirmos qual a melhor estratégia terapêutica para determinadas situações. Estas estão muito bem identificadas e classificadas e nós podemos de uma forma também muito objetiva delinear a melhor estratégia para o tratamento.
Uma das metas da Organização Mundial de Saúde, para o quinquénio 2016-2020, era reduzir cerca de 2% a 3% a taxa de mortalidade prematura, que ainda não sei se terá sido conseguido. Outro dos objetivos, que acredito ser de extrema importância e que parte do plano nacional de saúde, é aumentar o número de anos de vida saudável acima dos 65 anos, pois relativamente à União Europeia (UE), Portugal é o país onde as pessoas acima dos 65 anos de idade têm menos anos de vida saudável, quando comparados com o resto da UE. Em média os homens têm mais 7 anos e as mulheres mais 5 anos de vida saudável acima dos 65 anos, sendo estes valores que esperamos aumentar dentro dos próximos anos.
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