“A vacinação não é exclusiva das crianças”
Em entrevista, a Dr.ª Alberta di Pasquale destaca a importância da vacinação ao longo da vida numa sociedade cada vez mais envelhecida.
A capacidade de resposta a infeções varia ao longo da vida e é necessário agir e sensibilizar a comunidade para a importância da vacinação do adulto para proteger a sociedade. Perante o envelhecimento da população, a Diretora de Assuntos Médicos Globais e Educação Médica da Área de Vacinas da GlaxoSmithKline (GSK), a Dr.ª Alberta di Pasquale, reitera a importância da vacinação ao longo da vida.
Quais são os principais desafios da vacinação na população?
Os principais desafios da vacinação estão muito associados ao facto deo número atual de pessoas envelhecidas ser muito superior em comparação com a realidade de há 70 anos.
Estima-se que em 2050 se tenha o dobro da população com mais de 60 anos e muito poucas crianças. Será uma mudança drástica e sabemos que, quanto mais envelhecida, mais vulnerável será esta população.
Esta vulnerabilidade está associada à genética e à idade, mas também àquilo a que estamos expostos ao longo da nossa vida – o que comemos, os cuidados de higienização que temos e o que fazemos em termos de prevenção de doenças crónicas, como as cardiovasculares e oncológicas.
Outro fator importante, e que ainda não é muito abordado quando se pensa em medidas preventivas, é a forma como enfrentamos as doenças infeciosas, as que existem e as que irão surgir no futuro. Estas doenças têm um impacto enorme na nossa vida e, por isso, é importante que haja esta discussão, nomeadamente a nível da vacinação, em particular nos adultos, para preparar os anos futuros.
Quais são as três doenças infeciosas mais frequentes nos adultos?
Depende muito da área geográfica, mas as doenças às quais estamos mais expostos com maior frequência são a influenza, a infeção pneumocócica e a tosse convulsa, que é normalmente a menos conhecida no que toca à imunização dos adultos.
A imunidade à tosse convulsa não dura para sempre e, como tal, é necessário haver reforço ao longo da vida; cada vez mais dados mostram que há uma grande probabilidade de um indivíduo poder vir a ter tosse convulsa em idade mais avançada. Há pessoas que têm uma tosse que perdura há semanas e não têm a noção de que pode ser tosse convulsa.
A nível do sistema imunitário, quais as maiores diferenças entre crianças e adultos?
Nas crianças, as células envolvidas na imunidade inata [não adquirida porque está presente desde o nascimento], que detetam a presença de um agente infecioso, existem em maior quantidade e são muito mais ativas. À medida que a pessoa envelhece, estas células também envelhecem e deixam de estar presentes em tanta quantidade e não são tão ativas.
Além da imunidade inata, existe a imunidade adquirida, que é adaptativa, isto é, obtida através da criação da memória imunitária após a exposição a uma infeção. Os grupos de células envolvidas nesta imunidade adaptativa (células T e B) são finitas. Assim, de cada vez que são usadas para combater infeções, as células não são substituídas e o nosso corpo vai perdendo a capacidade de reação. É desta menor disponibilidade das células responsáveis pela imunidade adquirida que resulta a diminuição da imunidade associada à idade.
Em que se traduzem estas diferenças em termos de vacinação?
Perante estas diferenças, há estudos a serem desenvolvidos no sentido de solucionar este problema. Sabe-se que existem mecanismos de superação e está a concluir-se que é necessário o indivíduo encontrar-se num estado de boa saúde física geral e garantir que o sistema imunitário é estimulado da forma mais apropriada – estimulado não pela infeção, mas pela vacinação.
O que acontece quando se administra a vacina? Depende da bactéria. Algumas vacinas produzem uma resposta imunitária mais baixa nas pessoas mais velhas, por isso, o que os profissionais tentam fazer é determinar se esta inferioridade é um problema. Se,de facto, houver uma diferença significativa em relação aos jovens, pode ajustar-se a vacina consoante as necessidades do indivíduo, por exemplo, dando mais antígenos para impulsionar uma resposta semelhante à dos jovens. Nunca será a mesma, mas é sempre melhor.
Noutras situações, o adulto pode estar em vantagem em relação ao jovem se já tiver desenvolvido algumas defesas após exposição à infeção. É o caso do vírus influenza – uma dose da vacina é suficiente nos adultos, mas nas crianças ou jovens menos expostos provavelmente serão necessárias duas.
Qual é o impacto destas doenças evitáveis pela vacinação (DEV)?
O impacto sente-se em duas vertentes, na de saúde pública e na de saúde individual. As DEV estão a tornar-se nas patologias infeciosas mais prevalentes em adultos, uma vez que a população está cada vez mais envelhecida. Nos EUA, por exemplo, morrem 50 mil pessoas com mais de 60 anos todos os anos devido às DEV. Isto tem um custo, e é um custo que poderia ser evitado com mais campanhas de sensibilização à vacinação. Nas crianças, como a vacinação é bem conseguida, a maioria destas doenças não se manifesta.
E não é só a questão da mortalidade. Como o sistema imunitário fica mais fragilizado ao longo do processo de envelhecimento e quanto mais vezes estiver exposto a infeções, o organismo de um indivíduo mais velho deixa de reagir tão bem e a recuperação torna-se mais difícil, sendo provável que não retorne ao estado de saúde prévio.
A vacinação existe e é cada vez mais acessível. É altura de agir e sensibilizar para a importância da vacinação do adulto para proteger a sociedade. Não nos podemos esquecer de que vacinação é uma medida preventiva importante e não é exclusiva das crianças. É parte da promoção da saúde ao longo da vida.
eV/AR